Sermões de Spurgeon sobre as parábolasExemplo

1. Nossa primeira observação será que O MUNDO ESTÁ REPLETO DE AFLIÇÃO.

Esta é apenas uma história entre milhares baseadas em uma ocorrência infeliz. “Certo homem descia de Jerusalém para Jericó e veio a cair em mãos de salteadores”. Ele saiu para uma curta jornada e quase perdeu a vida na estrada. Nunca estamos a salvo de problemas. Eles nos encontram até mesmo ao pé da lareira da família e nos fazem sofrer pessoalmente ou por aqueles parentes mais queridos. Entram em nossas lojas e escritórios e nos provam. Quando saímos de casa, tornam-se nossos companheiros de viagem e compartilham a estrada conosco. “Porque a aflição não vem do pó, e não é da terra que brota o enfado. Mas o homem nasce para o enfado, como as faíscas das brasas voam para cima”.

Frequentemente as maiores aflições não são ocasionadas por falha do sofredor. Ninguém poderia culpar o pobre judeu de que, quando descia a Jericó para fazer negócios, os salteadores o acossaram e exigiram seu dinheiro, e de que quando o homem ofereceu resistência eles o feriram, despiram-no e o deixaram quase morto. Como ele poderia ser culpado? Para ele foi mero infortúnio.

Creiam-me, há muito pesar no mundo que não é resultado do vício ou da estupidez das pessoas que o enfrentam — ele vem da mão de Deus para o sofredor, não porque seja mais pecador do que os outros, mas para sábios propósitos desconhecidos a nós. Agora, esse é o tipo de aflição que, mais do que qualquer outro, exige a empatia cristã e a bondade que abunda em nossos hospitais. O homem não pode ser culpado por estar lá espancado e ferido — aquelas feridas abertas pelas quais sua vida se esvai não são autoinfligidas, nem recebidas de uma briga entre bêbados ou de uma façanha imprudente. Ele sofre sem culpa própria e, portanto, tem um clamor urgente por benevolência de seu próximo.

Certos caminhos da vida são particularmente sujeitos a aflições. A estrada entre Jerusalém e Jericó estava sempre infestada de salteadores. Jerônimo [N.E.: Historiador cristão que traduziu a Bíblia para o latim.] nos conta que era chamada de “caminho sangrento” por conta dos constantes assaltos e assassinatos que ali eram cometidos. E não faz tanto tempo para que não possa ser lembrado que um viajante inglês encontrou sua morte naquela estrada, e mesmo viajantes bem recentes nos dizem que já foram ameaçados ou realmente atacados naquela região especialmente sombria, o deserto que leva à cidade das palmeiras.

Da mesma forma, também no mundo ao nosso redor há caminhos da vida que são altamente perigosos e temerosamente assombrados por enfermidades e acidentes. Anos atrás, havia muitos ramos de negócios em que, por falta de precaução, a morte abatia aos milhares. Agradeço a Deus que as leis sanitárias e de prevenção são melhor observadas e que a vida humana seja, de alguma maneira, considerada preciosa. Ainda assim há caminhos da vida que podem ser chamados de “caminhos sangrentos”, ocupações necessárias à comunidade, mas altamente perigosas para aqueles que as praticam.

Agora, se você não tem tais ocupações, se seu caminho não o leva de Jerusalém para Jericó, ao contrário, o conduz talvez frequentemente de Jerusalém a Betânia, onde pode desfrutar da doçura do amor doméstico e dos deleites da comunhão cristã, você deve ser muito agradecido e estar ainda mais disposto a assistir aqueles que, para seu benefício ou da sociedade como um todo, têm de seguir os mais perigosos caminhos da vida. Você não concorda comigo que tais pessoas devem estar entre os primeiros a receber nossa bondade cristã? Eles estão em grande número nos hospitais e em outros lugares.

Que isso fique gravado. É claro que há muita aflição no mundo e muito dela é do tipo que merece receber socorro urgente.