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A Escola De Oração

Dia 2 de 7

O SALMO DO PASTOR E O PASTOR DO SALMO

Os salmos fazem parte de uma antologia universal do que há de melhor em literatura poética. Para muitos servem apenas para alimentar crendices religiosas (como a conhecida prática da Bíblia aberta no Salmo 91), mas para outros tantos são palavras vivas de confiança.

Calvino bem definiu o caráter do livro, vendo nele uma representação completa da alma humana, visto que não há sentimento humano que não seja mencionado nas suas linhas.

Mais do que isso, outros teólogos tem vislumbrado nas mensagens dos salmistas provas incontestáveis da ação de Deus em favor do indefeso, do injustiçado e do perseguido. E se Ele não está indiferente, a nossa convicção renova-se na esperança de que as nossas forças e as nossas necessidades serão supridas na medida da Sua soberana e poderosa vontade nas melhores ou nas piores circunstâncias.

O salmo 23, o mais lido de todos, tem sido cantado e recitado em orações chorosas, nos corredores da morte, nos últimos suspiros de vida, em crises e momentos de desespero, mas também na serenidade de corações em repouso. Seu conteúdo apela às mais profundas sensibilidades porque se baseia em duas figuras que representam as maiores necessidades humanas: liderança e acolhimento. As necessidades nas quais subjazem outras, não inferiores, mas complementares, tais como provisão, descanso, cura, propósito, livramento, proteção, disciplina e relacionamentos.

Nada mais distante da realidade alucinada dos grandes centros urbanos do que o bucolismo/caráter da figura do pastor. No entusiasmo de figurar a linguagem para descrever Deus, Davi encontrou na sua experiência de vida uma ideia mais do que abrangente: o pastor de ovelhas, em que estão reproduzidas as qualidades do cuidado constante, compatíveis com a atenção que grandes líderes precisavam de reunir no exercício das suas funções, tal como os reis daquele tempo que se autodenominavam pastores das suas nações.

Cheio de admiração pelo Deus que Se revelou pessoalmente, o pastor poeta não hesitou em chamá-lo de “meu”, traduzindo no pronome não o sentimento egoísta de posse, mas o traço relacional mais do que característico do Criador.

Na estabilidade desse relacionamento Davi sentiu-se suprido, e declarou em palavras que reverberam por quase três milénios o contentamento de alguém que de nada sentia falta. Não há como não notar o descompasso dessa certeza com o olhar de incerteza do nosso tempo que a todo instante está voltado para o que não se tem. O apóstolo Paulo faria tempos depois uma paráfrase não intencional, em Filipenses 4:19, dizendo: “E o meu Deus, segundo a sua riqueza em glória, há de suprir, em Cristo Jesus, cada uma de vossas necessidades.”

O pastor ideal, supridor de todas as coisas, não deixa faltar o descanso em pastos verdejantes e águas tranquilas, representando com essas imagens a riqueza do alimento para a alma (cf. Hebreus 5:12-14; 1 Pedro 2:2). O pastor supremo dá refrigério e restauração para ovelhas que, mesmo vivendo ciclos de desgaste e renovação, sabem que o descanso definitivo está preparado para a eternidade.

O pastor eterno também dá direção e propósito, tirando-nos do precipício do acaso, das cavernas do vazio interior, e das florestas do medo. Ele guia as Suas ovelhas, porque por amor do Seu nome prometeu fazer isso.

A sequência da narrativa do salmo é também pictórica, onde cada quadro retrata as circunstâncias de uma viagem, na qual o pastor é ainda o guia que zela pelo destino de quem conduz e pela sua própria reputação.

Conta-se que numa viagem aérea, onde grandes turbulências tiravam a paz dos passageiros e tripulantes, um menino chamava a atenção pela sua tranquilidade, a ponto de intrigar os seus vizinhos de assento. A certa altura da viagem, um desses, sem poder conter a sua admiração indagou o menino sobre como poderia estar tão tranquilo em situação de tanto perigo. A resposta do pequeno foi curta e segura: “o meu pai é o piloto”.

Se Davi fosse o menino responderia na mesma forma. As respostas dos salmos refletem essa atitude, como no capítulo 55, versículo 22: “Confia os teus cuidados ao SENHOR, e ele te susterá; jamais permitirá que o justo seja abalado”. Apesar dessa certeza, não há nas palavras do salmista ingenuidade a ponto de pensar que ele estaria livre de todo e qualquer sofrimento. A provisão divina para a tribulação não vem de um interruptor celestial onde as lutas cessam a um toque, mas surge de promessas de proteção e disciplina confortadora. Os vales da sombra da morte são lugares horríveis da nossa jornada nos quais muitas vezes ninguém caminha connosco, exceto o Pastor, o próprio Cristo, que andou por todos os nossos vales e os conhece mais do que ninguém. A sua vara, longe de causar medo, produz segurança, pois previne que venhamos a cair em perigos espirituais que poderiam causar a nossa destruição (Mateus 6:13).

Ainda sob a perspetiva da viagem, a ovelha tem acrescentada à sua condição peregrina a bênção do acolhimento pelo pastor anfitrião, que espelhando os mais dignos costumes da antiguidade oriental revela a sua gentil hospitalidade, com mesa farta, óleo sobre a cabeça, e um cálice transbordante. A esperança está visível em cada aspeto dessa bondade, a provisão espiritual da presença de Deus, mesmo em face de inimigos, a unção espiritual, e as bênçãos transbordantes de alegria, derramadas até à eternidade.

O fim da “viagem” não poderia ser outro. Davi conclui que o amor leal de Deus o seguiria por toda a sua vida e deseja ardentemente habitar na casa do Senhor para sempre. Nesse desejo, o que está em primeiro plano não é o local, a sua arquitetura ou a sua geografia, mas o simbolismo da presença do Todo Poderoso e do relacionamento com Ele. Retornar permanentemente ao convívio com Deus, à Sua santa presença, é a aspiração maior das ovelhas, dos hóspedes, dos crentes, que conhecem o seu pastor (João 10:11,14).

Contou alguém que numa congregação, duas pessoas foram convidadas a recitar o Salmo 23. A primeira, um jovem arrogante, fê-lo com elegância, ímpeto e excelente oratória. A segunda, um idoso senhor, recitou cada palavra vagarosamente, como se estivesse narrando a história da sua própria vida na companhia do Pastor. Este último, naturalmente, produziu na igreja grande comoção, pelo realismo da Bíblia na sua vida.

Que Deus nos ajude a ler e compreender esta porção da Palavra de Deus com profundidade, a ponto de recitá-la como uma breve autobiografia, repleta de confiança no Pastor que é Senhor.

Wilson Avilla

Escritura

Dia 1Dia 3

Sobre este plano

A Escola De Oração

O livro de Salmos é um grande dicionário de emoções e sentimentos. Nele está descrito todo o repertório existencial de qualquer ser humano. Eugene Peterson tem chamado essa coleção de poesias de ‘Escola de Oração’. Os salmos ensinam como orar com confiança e dependência de Deus em todos os momentos da vida, sejam de alegria ou tristeza.

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Gostaríamos de agradecer ao #V3 Comunidade Cristã por fornecer este plano. Para mais informações, visite: https://prwilsonavilla.blogspot.com/