Advento: de Onde Brota a EsperançaSample

Botar a Cara No Sol

Não é curioso e assustadoramente belo como o mais radical ato de vitória da narrativa bíblica se dá na simplicidade vulnerável e visceral de um nascimento? Isso diz muito.

O Eterno descortina-se em um cenário improvável. Para contemplar ainda mais o relato que se passa em Belém, vamos por um instante ao antigo Reino do Sul.

Os livros proféticos comprovam que a Bíblia, além de biblioteca, é uma escola de literatura. As palavras têm corpo, temperatura e textura — dá quase para tocá-las.

Isaías escreve: “Então a glória do Senhor será revelada, e todos a verão. […] O capim seca e as flores murcham, mas a palavra de nosso Deus permanece para sempre” (Is 40.5, 8).

No trecho que introduz a chegada do Servo Sofredor (Is 40.1-11), há um termo importantíssimo das Escrituras: kavod, palavra hebraica que traduzimos por “glória”. Repare que o autor tece uma teia de contrastes para ressaltar a singularidade da glória divina. Sua densidade, plenitude e presença. Adiante Isaías escreve:

“Você não precisará do brilho do sol durante o dia, nem da claridade da lua durante a noite, pois o Senhor será sua luz eterna; seu Deus será sua glória” (60.19).

Aqui, “glória” é sinônimo de “luz” — luz perene, permanente (leia também Ezequiel 10.4).

Como bem nota o teólogo Thaddeus J. Williams, “Para os escritores bíblicos, Deus não era uma distante ideia bruxuleante, mas uma pessoa bastante real, luminosa e radiante”.

Toda a cena nada glamourosa — mas veementemente gloriosa — de Belém testemunha disto: “Deus não é uma ideia distante. Ele se revela como um Deus que se gloria em doar-se, como o denso Sol que irradia luz”.

Luz tão real quanto a que nos atravessa à beira do mar no verão, sabe? Como o calor tátil do Natal nos trópicos. Luz que invade e desmancha as trevas de um cosmos caído e corações quebrados.

A irresistível resposta à boa-nova da encarnação é esta: “Expor-se, através de um caminhar diário com ele, aos raios da glória de Deus”; ou, em termos mais tropicais, “botar a cara no sol”.

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Texto: Bruno Maroni

Arte: Lucas Pegoraro

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